Filha de dona Neusa Moraes e seu José Manoel, Fabiana Moraes nasceu no Alto José Bonifácio, um dos morros do Recife. Ainda menina, escrevia com algumas letras faltando e outra errada que ia ser jornalista: “el vo jornalista”. “Já tinha esse entendimento do que ela queria ser profissionalmente, mas aquilo ali para mim era coisa de criança", relembra Neusa, em entrevista ao documentário “Fabiana Moraes - Brilho e Combate”.
Mas o sonho do jornalismo não era fantasia de criança, a menina Fabi cresceu, tornou-se jornalista, escritora, doutora em sociologia, pesquisadora e professora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Realiza um trabalho comprometido em denunciar violações e contar histórias que importam. E é esta história de compromisso do jornalismo com os direitos sociais e humanos que levou a Abraji a escolher Fabiana como a homenageada do Congresso Internacional de Jornalismo Investigativo deste ano. O documentário foi apresentado durante a homenagem.
Bicha quer, bicha faz
A chegada à universidade não foi fácil, assim como é a realidade de milhares de jovens pobres brasileiros que sonham em cursar o ensino superior. O pai, seu José, dizia para a filha fazer um curso técnico, mas Fabiana o convenceu de que ela queria entrar na universidade. Fabiana, precisava acordar cedo e fazer um longo trajeto até chegar à aula do cursinho preparatório. “Foi um período que me dediquei muito. O bicha quer, bicha faz. Dei todo o gás possível. Aconteceu que fiquei um pouco doente nesse período. Pouco doente é eufemismo”, relembra.
O jornal chegou com o resultado do vestibular, mas lhe faltou coragem para conferir. A confirmação da entrada na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) veio com um abraço emocionado da mãe. “Esse dia, para mim, foi especial, eu sabia que ela ia mudar a história dela”, lembra Neusa Moraes.
No jornalismo, além de produzir, Fabiana também reflete sobre a profissão. Em seu livro “A pauta é uma arma de combate”, ela defende a ideia da subjetividade jornalística, que rompe com o mito da imparcialidade, sem abrir mão dos métodos jornalísticos de apuração e técnicas de reportagem. “Eu ficava incomodada com a forma com que o jornal retratava os morros e periferias”, afirma a escritora no documentário.
“Eu penso que a pauta às vezes é uma espécie de pá para ir quebrando a crosta, quebrando a terra, para você desnaturalizar aquilo que está muito assentado e visto como normal”, acrescenta a homenageada no 19º Congresso de Jornalismo Investigativo da Abraji.
A reportagem de Fabiana “O Nascimento de Joicy”, que narra a cirurgia de redesignação sexual da cabeleireira Joicy Melo da Silva, de 51 anos, moradora de Alagoinha (PE), devolveu a Samira de Castro, presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ), o encantamento pelo jornalismo. “Eu estava muito desiludida com a profissão, eu pensava realmente em abandonar o jornalismo quando eu descobri a reportagem O Nascimento de Joicy. Eu me encantei novamente pelo jornalismo”, contou ela à Abraji.
Samira de Castro falou também sobre a importância de Fabiana Moraes ter sido homenageada no Congresso da Abraji. “Para nós, que somos jornalistas fora do eixo Sudeste-Sul, ter uma mulher jornalista, pesquisadora e nordestina homenageada é muito importante. É o reconhecimento de que se faz jornalismo fora dos grandes centros urbanos.”
Brilho e combate
Além de depoimentos de familiares, o documentário sobre Fabiana Moraes traz entrevistas com amigos e colegas de profissão da autora. Entre eles, Cecília Olliveira, diretora da Abraji, cofundadora do The Intercept Brasil e Instituto Fogo Cruzado; Neon Cunha, publicitária e diretora de arte, e Paula Miraglia, cofundadora da Gama Revista.
“Ela [Fabiana] nos move, nos puxa o tempo todo com suas palavras”, disse Cecília Olliveira.
O documentário “Fabiana Moraes - Brilho e Combate”, produzido pelo Caldo de Cana Filmes e com direção executiva de Gabi Coelho, jornalista independente e diretora da Abraji, está disponível neste link, com toda a homenagem à jornalista.
*Crédito das fotos: Luciana Vassoler/Abraji